sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Especial: Neruda V




Peço Silêncio


Agora me deixem tranquilo.
Agora se acostumem sem mim.

Eu vou cerrar meus olhos.

Somente quero cinco coisas,
cinco raízes preferidas.

Uma é o amor sem fim.

A segunda é ver o outono.
Não posso ser sem que as folhas
voem e voltem à terra.

A terceira é o grave inverno,
a chuva que amei, a carícia
do fogo no frio silvestre.

Em quarto lugar o verão
redondo como uma melancia.

A quinta coisa são os teus olhos,
Matilde minha, bem-amada,
não quero dormir sem teus olhos,
não quero ser sem que me olhes:
eu mudo a primavera
para que me sigas olhando.
Amigos, isso é quanto quero.
É quase nada e quase tudo.

Agora se querem, podem ir.

Vivi tanto que um dia
terão de por força me esquecer,
apagando-me do quadro-negro:
meu coração foi inteminável.

Porém porque peço silêncio
não creiam que vou morrer:
passa comigo o contrário:
sucede que vou viver.

Sucede que sou e que sigo.

Não será, pois lá bem dentro
de mim crescerão cereais,
primeiro os grãos que rompem
a terra para ver a luz,
porém a mãe terra é escura:
e dentro de mim sou escuro:
sou como um poço em cujas águas
a noite deixa suas estrelas
e segue sozinha pelo campo.

Sucede que tanto vivi
que quero viver outro tanto.

Nunca me senti tão sonoro
nunca tive tantos beijos.

Agora, como sempre, é cedo.
Voa a luz com suas abelhas.
Me deixem só com o dia.
Peço licença para nascer.

De Estravagario


Quem ler o poema vai entender porque escolhi para terminar os posts especiais Neruda!
Ele tem um tom de despedida e recomeço ideal para a ocasião. É profundo e renovador.

A obra de Neruda é tão extensa e sensível que poderia dedicar muitos outros posts a ele. Mas decidi terminar por aqui para abrir espaço para outros versos.

Não deixem de admirar os poemas maravilhosos e universais de Neruda. Suas palavras merecem a eternidade.

Obrigada!
"y desde entonces soy porque tú eres,
y desde entonces eres, soy e somos
y por amor seré, serás, seremos"

Nick* Fabrini


sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Especial: Neruda IV




O Amor


Amo o amor que se reparte
em beijos, leito e pão.

Amor que pode ser eterno
mas pode ser fugaz.

Amor que se quer liberar
para seguir amando.

Amor divinizado que vem vindo.
Amor divinizado que se vai


Pablo Neruda - De Crepusculario




Bem singelo mas muito lindo!
Estou colocando só as poesias de amor porque, particularmente, eu acho que Neruda sabia escrevê-las com perfeição e são as que eu gosto mais!
Espero que vocês gostem também!
Mas vou colocar sobre outros temas nos próximos posts!



Nick* Fabrini






quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Especial: Neruda III




Não te amo como se fosses rosa de sal, topázio
ou flecha de cravos que propagam o fogo:
te amo como se amam certas coisas escuras,
secretamente, entre a sombra e a alma.

Te amo como a planta que não floresce e leva
dentro de si, escondida, a luz daquelas flores,
e graças a teu amor vive escuro em meu corpo
o estreitado aroma que subiu da terra.

Te amo sem saber como, nem quando, nem de onde,
te amo diretamente, sem problemas nem orgulho:
assim te amo porque não sei amar de outra maneira,

a não ser deste modo em não sou nem és,
tão perto que tua mão sobre meu peito é minha,
tão perto que se fecham teus olhos com meu sono.

Pablo Neruda - De Cien sonetos de amor


Considero este poema um dos sonetos de amor mais lindos que existe. Não há palavras para descrever tanta sensiblilidade e beleza. Perfeito!



Nick* Fabrini


terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Especial: Neruda II





Prefiro que não, amada.


Para que nada nos amarre
que nada nos una.


Nem a palavra que aromou tua boca,
nem o que não disseram as palavras.


Nem a festa de amor que não tivemos,
nem teus soluços perto da janela.


Amo o amor dos marinheiros
que beijam e se vão.


Deixam uma promessa.
Não voltam nunca mais.


Em cada porto uma mulher espera:
os marinheiros beijam e se vão.


Uma noite se deitam com a morte
no leito do mar.



Pablo Neruda




Espero que gostem!




Nick* Fabrini



Especial: Neruda I






Para meu coração basta teu peito
para que sejam livres as minhas asas.
De minha boca chegará até o céu
o que dormido estava em tua alma.

Tu trazes a ilusão de cada dia.
Chega como o orvalho na corolas.
Com tua ausência escavas o horizonte
Eternamente em fuga, irmã das ondas.

Já disse que teu canto era o do vento
como cantam os mastros e os pinheiros.
És como eles, alta e taciturna.
E estristeces de pronto, como uma viagem.

Acolhedora como antiga senda
Abrigas ecos e vozes nostalgicas.
Desperto e alguma vez emigram, fogem
pássaros dormidos em tua alma.

Pablo Neruda

Resolvi fazer um especial no blog de poesias de Pablo Neruda.
Eu simplesmente amo as poesias dele e o modo como ele as escreve. Não canso de ler e reler.
Durante essa semana vou postar aqui as minhas preferidas. Espero que gostem e que sintam a mesma emoção que eu sinto!

Pablo Neruda (1904-1973), poeta, chileno e universal


Nick Fabrini